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Compreendendo as Hipóteses de Reajuste em Contratos Administrativos: Uma Análise Detalhada da Legislação Brasileira

Juliano Machado

No dinâmico cenário das contratações públicas, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos assume um papel crucial para garantir a continuidade da execução dos serviços, obras ou fornecimentos, bem como para proteger os interesses tanto da Administração Pública quanto do contratado. Nesse contexto, o instituto do reajuste contratual emerge como um mecanismo fundamental para adaptar os preços inicialmente pactuados às variações econômicas supervenientes.
A legislação brasileira, notadamente a Lei nº 14.133/21 (a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos), estabelece as balizas para a aplicação do reajuste, diferenciando-o de outros mecanismos de alteração contratual, como a repactuação e a revisão. Compreender as nuances de cada um desses institutos e as hipóteses em que o reajuste é permitido é essencial para uma gestão contratual eficiente e transparente.

A Essência do Reajuste Contratual: Adaptação aos Efeitos da Inflação

O reajuste de preços, em sua essência, consiste na atualização monetária do valor contratual original, com o objetivo de recompor o poder aquisitivo da moeda frente à inflação acumulada no período de execução do contrato.

Trata-se de um mecanismo automático, previamente estabelecido no edital e no contrato, que utiliza índices específicos para calcular a variação dos preços.

A Lei nº 14.133/21 prevê a possibilidade de reajuste de preços nos contratos administrativos com prazo de duração superior a um ano. Essa exigência visa proteger o contratado dos efeitos inflacionários que, ao longo do tempo, poderiam corroer a rentabilidade do contrato e comprometer sua execução.

A nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/21), em seu artigo 92, inciso V, determina a obrigatoriedade de previsão de mecanismos de atualização, reajuste ou repactuação de preços, conforme o caso, com a respectiva periodicidade. O artigo 135 detalha as regras para o reajuste, mantendo o prazo mínimo de um ano para sua aplicação, contado da data da apresentação da proposta ou do orçamento a que ela se refere.

É crucial ressaltar que o reajuste deve ser sempre referenciado a índices oficiais ou setoriais específicos, divulgados por órgãos competentes, que reflitam a variação dos custos dos insumos utilizados na execução do contrato. A escolha do índice adequado é fundamental para garantir a justa recomposição dos preços, evitando tanto o enriquecimento sem causa do contratado quanto o prejuízo para a Administração Pública.

Hipóteses Válidas para o Reajuste Contratual: O Efeito da Inflação no Tempo

As hipóteses válidas para a aplicação do reajuste contratual estão intrinsecamente ligadas à passagem do tempo e à ocorrência de inflação. O objetivo é manter o valor real do contrato, protegendo-o da desvalorização da moeda.

Por exemplo, nos contratos de prestação de serviços continuados. Em contratos de limpeza, vigilância, manutenção predial ou outros serviços de longa duração, a inflação acumulada ao longo dos anos pode impactar significativamente os custos com salários, materiais e encargos. A aplicação do índice de reajuste previsto contratualmente garante a recomposição desses custos.

Outro exemplo são os contratos de fornecimento de bens com entrega parcelada. Em contratos de fornecimento de equipamentos, materiais de construção ou outros bens com entregas programadas ao longo de um período superior a um ano, o reajuste permite ajustar os preços das parcelas futuras, considerando a inflação ocorrida desde a data da proposta.

Ainda podemos citar os contratos de obras de longa duração. Em obras de construção civil com prazos de execução plurianuais, os custos com materiais, mão de obra e equipamentos podem sofrer variações significativas devido à inflação. O reajuste contratual possibilita a atualização dos valores das etapas subsequentes da obra.
Em todos esses casos, a aplicação do reajuste é legítima e visa preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, garantindo que o contratado não seja prejudicado pela perda do poder aquisitivo da moeda ao longo do tempo.

Hipóteses de Reajuste Recusadas: Desvios da Finalidade e Ausência de Previsão Legal

Apesar da importância do reajuste, sua aplicação não é irrestrita. A legislação e a jurisprudência estabelecem limites claros para evitar o uso indevido desse mecanismo para obter vantagens indevidas ou para compensar outros tipos de desequilíbrio contratual.

Não se faz possível, por exemplo, pleitear o reajuste com periodicidade inferior a um ano, a Lei nº 14.133/21 é clara ao estabelecer o interregno mínimo de um ano para a aplicação do reajuste. Cláusulas contratuais que prevejam reajustes em períodos inferiores são consideradas ilegais.

Outro aspecto é que o reajuste tem como objetivo compensar a inflação futura, a partir da data em que se completa o período de um ano. A aplicação retroativa do índice de reajuste para períodos anteriores não encontra amparo legal.

Também não poderemos falar de reajuste contratual com base em índices genéricos que não refletem os custos do setor. A escolha do índice de reajuste deve ser pertinente ao objeto do contrato e refletir a variação dos custos dos principais insumos utilizados. A utilização de índices gerais de inflação, que não guardam relação com os custos específicos do setor, pode ser questionada e inviabilizar a alteração de valor.

O reajuste não serve para compensar eventos imprevisíveis ou onerosidade excessiva. Situações de desequilíbrio contratual decorrentes de fatos imprevisíveis ou de onerosidade excessiva para o contratado não devem ser resolvidas por meio do reajuste, mas sim pelos mecanismos de revisão contratual, que possuem pressupostos e procedimentos distintos.

Nesses casos, a aplicação do reajuste seria considerada indevida, podendo gerar questionamentos por parte dos órgãos de controle e até mesmo a responsabilização dos gestores públicos.

Desvendando as Diferenças: Reajuste, Repactuação e Revisão Contratual

É fundamental distinguir o reajuste de outros mecanismos de alteração contratual previstos na legislação: a repactuação e a revisão. Embora todos tenham como objetivo restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, seus pressupostos e formas de aplicação são distintos.

O reajuste, como já explicado, é um mecanismo automático de atualização monetária, previamente estabelecido no contrato, com periodicidade mínima anual, utilizando índices específicos para compensar a inflação. Não depende da ocorrência de fatos supervenientes imprevisíveis.

A repactuação, por sua vez, é um mecanismo de negociação entre a Administração e o contratado, utilizado principalmente em contratos de prestação de serviços continuados com dedicação exclusiva de mão de obra. Seu objetivo é adequar os preços aos novos custos de mercado, como aumentos salariais decorrentes de convenções coletivas de trabalho ou alterações nas alíquotas de encargos sociais. A repactuação não está necessariamente vinculada a um índice específico e pode ocorrer em períodos inferiores a um ano, desde que comprovada a alteração dos custos. A Lei nº 14.133/21 aborda a repactuação em seus artigos 135, §5º e §6º.

A revisão contratual (ou reequilíbrio econômico-financeiro do contrato), anteriormente prevista no artigo 65, inciso II, alínea "d" da Lei nº 8.666/93 e atualmente no artigo 124, inciso II, alínea "d" da Lei nº 14.133/21, é um mecanismo excepcional de alteração contratual, utilizado quando ocorrem fatos supervenientes imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que alterem significativamente o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, tornando a sua execução excessivamente onerosa para uma das partes.

A revisão depende da comprovação da ocorrência desses eventos e da demonstração do desequilíbrio contratual, sendo formalizada por meio de aditivo contratual.
Em suma, enquanto o reajuste visa compensar a inflação de forma automática e periódica, a repactuação busca adequar os preços aos custos de mercado em contratos de serviços com mão de obra dedicada, e a revisão tem como objetivo restabelecer o equilíbrio contratual em face de eventos extraordinários.

A Importância da Clareza e da Conformidade na Aplicação do Reajuste

A correta compreensão e aplicação das hipóteses de reajuste em contratos administrativos são fundamentais para garantir a legalidade, a transparência e a eficiência das contratações públicas. A observância dos requisitos e limites estabelecidos na legislação, a escolha adequada dos índices de reajuste e a distinção clara entre reajuste, repactuação e revisão são práticas essenciais para uma gestão contratual responsável e para a proteção dos interesses públicos e privados.

Ao dominar os nuances do reajuste contratual, os gestores públicos e os contratados estarão mais bem preparados para conduzir os contratos administrativos de forma equilibrada, evitando litígios e garantindo a efetiva entrega dos bens, serviços e obras à sociedade.

A busca por informações atualizadas e o acompanhamento das orientações dos órgãos de controle são atitudes proativas que contribuem para a segurança jurídica e o sucesso das contratações públicas no Brasil.

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