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Reequilíbrio Econômico-Financeiro nos Contratos Administrativos: Garantindo a Justa Execução Diante de Imprevistos

Juliano Machado

Entenda a Diferença Crucial entre Reajuste e Reequilíbrio e Saiba Como Assegurar a Continuidade Contratual

No intrincado universo dos contratos administrativos, a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro assume um papel de suma importância para garantir a justa e contínua execução dos serviços, obras ou fornecimentos contratados. Embora frequentemente confundido com o reajuste de preços, o reequilíbrio econômico-financeiro possui natureza e finalidade distintas, sendo acionado em cenários específicos onde eventos supervenientes e imprevisíveis alteram significativamente as condições originalmente pactuadas.

Compreender a essência do reequilíbrio, suas diferenças em relação ao reajuste, os cenários que justificam sua aplicação e o procedimento para sua solicitação é fundamental para as empresas contratadas pela administração pública. Este artigo visa desmistificar esse importante instituto jurídico, oferecendo um guia detalhado e educativo para assegurar que os direitos das partes sejam preservados e a execução contratual não seja inviabilizada por fatores externos inesperados.

Desvendando o Conceito de Reequilíbrio Econômico-Financeiro

O reequilíbrio econômico-financeiro de um contrato administrativo consiste na restauração da relação originalmente estabelecida entre os encargos do contratado e a remuneração a ser paga pela administração pública. Essa recomposição se torna necessária quando eventos extraordinários e imprevisíveis, alheios à vontade das partes, impactam de forma significativa os custos de execução do contrato, tornando a sua manutenção excessivamente onerosa para o particular.

A base legal para o reequilíbrio reside no princípio da manutenção do equilíbrio contratual, implícito em toda relação contratual e explicitamente previsto no artigo 65, inciso II, alínea “d”, da Lei nº 8.666/93 (antiga Lei de Licitações) e no artigo 124, inciso II, alínea “d”, da Lei nº 14.133/21 (Nova Lei de Licitações). Esses dispositivos asseguram ao contratado o direito à revisão do contrato para restabelecer a equação econômico-financeira inicial, desde que comprovada a ocorrência de fatos que alterem substancialmente os custos contratuais.

A Distinção Fundamental entre Reequilíbrio e Reajuste

É crucial distinguir o reequilíbrio econômico-financeiro do reajuste de preços. Embora ambos os mecanismos visem ajustar o valor do contrato, suas naturezas e pressupostos são distintos:

Reajuste: O reajuste é um mecanismo de correção monetária previamente estabelecido no contrato, geralmente com periodicidade anual, que visa repor a perda do poder aquisitivo da moeda em decorrência da inflação. Ele é aplicado de forma automática, seguindo os índices e critérios definidos no edital e no contrato, sem a necessidade de comprovação de um evento extraordinário. O reajuste é, portanto, previsível e inerente à dinâmica econômica.

Reequilíbrio Econômico-Financeiro: O reequilíbrio, por outro lado, é uma medida excepcional, acionada diante de eventos supervenientes e imprevisíveis que desestabilizam a equação econômica original do contrato, tornando a sua execução excessivamente onerosa para o contratado. Ele não é automático e exige a comprovação do impacto financeiro decorrente do evento desequilibrador. O reequilíbrio busca restaurar a relação inicial entre os custos e a remuneração, e não apenas corrigir a inflação.

Em suma, o reajuste visa manter o valor real da remuneração ao longo do tempo, enquanto o reequilíbrio busca recompor a relação econômica original do contrato diante de eventos inesperados que alteram significativamente os custos.

Cenários que Justificam o Pedido de Reequilíbrio Econômico-Financeiro

A legislação e a jurisprudência apontam para alguns cenários típicos que podem ensejar o pedido de reequilíbrio econômico-financeiro. É importante ressaltar que a caracterização do desequilíbrio exige a comprovação da ocorrência de um evento extraordinário e imprevisível, com impacto financeiro relevante sobre os custos contratuais.

O aumento abrupto e imprevisível de insumos é um destes casos. Uma elevação repentina e significativa nos preços de materiais, matérias-primas ou outros insumos essenciais à execução do contrato, que não poderia ter sido prevista no momento da apresentação da proposta, pode desequilibrar a equação econômica original. A imprevisibilidade e a magnitude do aumento são elementos cruciais para a caracterização desse cenário. Pode-se citar como exemplo o ocorrido quando da eclosão da Pandemia de Covid-19, que inflacionou os preços de forma considerável, sem que fosse possível aos contratados e contratantes preverem tal situação.

A ocorrência de alterações unilaterais do contrato pela administração também pode gerar o direito ao reequilíbrio do contrato. Modificações contratuais impostas unilateralmente pela administração pública, como modificação no projeto ou nas condições de entrega de produtos, nos termos do artigo 65, inciso I, da Lei nº 8.666/93 e artigo 124, inciso I, da Lei nº 14.133/21, que acarretem um aumento significativo nos encargos do contratado, podem gerar o direito ao reequilíbrio. É fundamental que essas alterações não decorram de erros ou omissões na proposta do contratado.

Alterações legislativas, como a edição de novas Leis, Regulamentos ou Instruções Normativas, também possibilitam o pedido de reequilíbrio. A superveniência de normas legais ou regulamentares que criem novas obrigações ou aumentem os custos do contratado para a execução do objeto contratual pode justificar o pedido de reequilíbrio. A imprevisibilidade da edição dessas normas e o impacto financeiro direto sobre o contrato são requisitos importantes e devem ser comprovados no requerimento.

Outros fenômenos também podem ser utilizados como justificativa para o pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. A Força Maior e Caso Fortuito, que tem como definição a ocorrência de eventos imprevisíveis e inevitáveis, como fenômenos naturais de grande magnitude (terremotos, inundações), greves gerais ou outros acontecimentos que impossibilitam ou dificultam significativamente a execução do contrato e elevam seus custos, podem configurar hipóteses de força maior ou caso fortuito, ensejando o reequilíbrio.

Embora de aplicação mais restrita e dependente de comprovação robusta, eventos econômicos excepcionais e imprevisíveis, alheios aos riscos normais da contratação, que causem um desequilíbrio significativo na relação entre os encargos do contratado e a remuneração, podem fundamentar o pedido de reequilíbrio.


É importante ressaltar que meras dificuldades financeiras da empresa contratada ou eventos previsíveis e inerentes ao risco da atividade empresarial não justificam o pedido de reequilíbrio. A ocorrência de um evento verdadeiramente extraordinário, imprevisível e com impacto financeiro relevante e seu efeito no contrato são essenciais para a configuração do direito à percepção do reequilíbrio.

Passo a Passo para Solicitar o Reequilíbrio Econômico-Financeiro

O procedimento para solicitar o reequilíbrio econômico-financeiro pode variar ligeiramente dependendo do órgão contratante e das normas internas, mas geralmente envolve as seguintes etapas:

1. Identificação e Análise do Evento Desequilibrado

O primeiro passo é identificar precisamente o evento superveniente e imprevisível que causou o desequilíbrio econômico-financeiro do contrato. É crucial analisar detalhadamente o impacto desse evento sobre os custos de execução contratual, quantificando as perdas ou o aumento de despesas.

2. Reunião e Organização da Documentação Comprobatória

É fundamental reunir toda a documentação que comprove a ocorrência do evento desequilibrador, sua imprevisibilidade e o impacto financeiro sobre o contrato. Essa documentação pode incluir a notificação formal à administração pública, comunicando a ocorrência do evento e a intenção de solicitar o reequilíbrio. A estruturação de relatórios técnicos detalhando o evento, sua natureza extraordinária e imprevisível, e como ele afetou a execução do contrato.

Quem irá requerer o reequilíbrio deverá também elaborar Planilhas de custos comparativas, demonstrando a variação dos preços dos insumos, os novos custos decorrentes da alteração legislativa, ou outros impactos financeiros relevantes, comparando a situação original com a situação atual.

Para comprovar essas alterações é crucial apresentar notas fiscais, cotações e outros documentos que evidenciem o aumento dos custos. Há órgãos que solicitam que essas notas fiscais e documentos estejam todos em nome da empresa requerente, outros sequer pedem estes documentos. É aconselhável manter um histórico das compras realizadas pela empresa e, também, das cotações realizadas com fornecedores habituais. Assim consegue-se comprovar mais facilmente as alterações significativas nos preços.

A estruturação de um parecer técnico e jurídico, que demonstre o enquadramento da hipótese legal a situação fática ocorrida facilita a percepção do reequilíbrio econômico-financeiro do contrato.

Por fim, também deve-se apresentar o cronograma físico-financeiro atualizado, demonstrando o impacto do evento sobre o fluxo de caixa do contrato. E, claro, outros documentos relevantes que possam auxiliar na comprovação do desequilíbrio também devem ser anexados, como notícias de sites confiáveis, por exemplo.

3. Elaboração do Pedido Formal de Reequilíbrio

Com a documentação organizada, o contratado deve elaborar um pedido formal de reequilíbrio econômico-financeiro, direcionado à autoridade competente da administração pública. O pedido deve ser claro, objetivo e bem fundamentado, e deve conter a identificação do contrato, tal como número do contrato, objeto e partes envolvidas.
No requerimento, deve ocorrer a descrição detalhada do evento desequilibrador, explicando sua natureza extraordinária e imprevisível. Caso possível, a argumentação deve ser formulada de maneira a já enquadrá-la nas hipóteses legais.

Esse enquadramento nas hipóteses legais de reequilíbrio é o que se chama de demonstração do nexo de causalidade, ou seja, liga o evento ao aumento dos custos de execução contratual.

Como se estará pleiteando a modificação financeira do contrato, evidente que deve ser apresentado, de forma clara e precisa, a quantificação do impacto financeiro, apresentando o montante do desequilíbrio. E, ainda, deve-se apresentar a proposta de recomposição do equilíbrio, indicando a forma como o equilíbrio econômico-financeiro do contrato pode ser restabelecido (revisão de preços, alteração de prazos, etc.).

Por fim, um pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato bem estruturado deverá indicar a fundamentação legal e contratual, citando as cláusulas contratuais e os dispositivos legais que amparam o pedido. Também é recomendável citar decisões de casos semelhantes onde ocorreu o desequilíbrio e este foi ajustado mediante reajuste do contrato.

4. Protocolo do Pedido Junto à Administração Pública

O pedido formal de reequilíbrio, juntamente com toda a documentação comprobatória, deve ser protocolado no setor competente da administração pública, seguindo os procedimentos internos do órgão contratante. É importante obter um comprovante de recebimento do pedido.

5. Análise e Decisão da Administração Pública

A administração pública analisará o pedido, podendo solicitar informações ou documentos adicionais ao contratado. A decisão sobre o pedido de reequilíbrio deve ser motivada e fundamentada em pareceres técnicos e jurídicos. O prazo para análise e decisão pode variar, não havendo nada estabelecido na Lei a respeito.

Caso ocorra demora injustificada, pode o contratado proceder com a paralisação do serviço até que a Administração Pública se manifeste, contudo, recomendamos que isto seja formalmente comunicado para o órgão público, mediante protocolo.

6. Formalização do Reequilíbrio

Caso o pedido seja deferido, o reequilíbrio econômico-financeiro será formalizado por meio de um termo aditivo ao contrato, que detalhará as novas condições contratuais e os ajustes financeiros necessários para restabelecer o equilíbrio.

Caso o pedido seja indeferido, pode o requerente proceder com o pedido de rescisão contratual ou ainda ingressar judicialmente para fazer valer seu direito. No que diz respeito a demandas judiciais, deve-se lembrar que o deferimento ou não do pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato é um ato discricionário da administração pública, oportunidade em que na esfera judicial o debate deve se focar nos requisitos formais do pedido.

É fundamental que o contratado acompanhe de perto a tramitação do pedido e esteja disponível para fornecer quaisquer informações ou esclarecimentos adicionais que a administração pública possa solicitar.

Em caso de indeferimento do pedido, é importante analisar as razões da decisão e avaliar a possibilidade de interposição de recursos administrativos ou medidas judiciais cabíveis.

A Importância da Assessoria Especializada

Diante da complexidade dos contratos administrativos e da necessidade de comprovar de forma robusta a ocorrência do desequilíbrio econômico-financeiro, contar com a assessoria de profissionais especializados em direito administrativo e em análise financeira pode ser fundamental para o sucesso do pedido.

Um advogado e um contador com expertise em contratos públicos poderão auxiliar na identificação dos cenários que justificam o reequilíbrio, na organização da documentação comprobatória, na elaboração do pedido formal e no acompanhamento do processo administrativo.

Em suma, o reequilíbrio econômico-financeiro é um direito fundamental do contratado em face de eventos supervenientes e imprevisíveis que alterem significativamente as condições originais do contrato administrativo.

Compreender sua natureza, diferenciá-lo do reajuste, conhecer os cenários que o justificam e seguir o procedimento correto para sua solicitação são passos essenciais para garantir a justa execução contratual e a saúde financeira da sua empresa no âmbito das contratações públicas.


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