O direito real no âmbito imobiliário
Um dos principais elementos que afetam o âmbito do direito civil é a conceituação e estabelecimento dos bens, e consequentemente, as suas questões pertinentes. Nesse aspecto do direito, dentro da área de abrangência do direito civil, é que se aborda o direito real, e as suas áreas correlatas.
Diferentemente do que o nome pode sugerir, o direito real não se relaciona com uma governança monárquica, mas sim com os bens, derivada do latim “res”. Por isso a matéria é também abordada como “direito das coisas”, sendo considerado como “coisa” tudo aquilo que pode ser objeto de algum direito por alguma pessoa ou um ente jurídico.
Mas a que interessa o direito real? Enquanto ramificação do direito civil, o âmbito do direito real é uma espécie que afeta a todos os demais elementos: no direito de família e no direito sucessório, um imóvel que é objeto de partilha é considerado um direito real; no direito empresarial, o capital social integralizado, representado por determinado bem, refere-se ao direito real; no direito do consumidor, os contratos de alienação fiduciária para aquisição de determinado bem abordam, diretamente, os direitos reais.
E como funciona? O direito real, por ser vinculado a uma coisa, ele tem necessariamente uma condição de ser um direito público. E justamente por ser público, ele pode ser oponível a quem quer que venha a questioná-lo. Portanto, para que determinada coisa possa ser de propriedade de alguém, ela deve atentar às normas legais que determinam a sua propriedade. Por exemplo, só é dono de imóvel quem registra o mesmo no Cartório de Registro de Imóveis competente. Por ser público, o direito real deve estar previsto em lei, pois somente assim se compreende que ele deva valer para todos os cidadãos.
Mas pergunta-se, novamente, o que vem a ser direito real em específico? Um bem objeto de direitos divide-se, basicamente, em quatro campos diferente: a disposição, a fruição, o uso e a retomada. A propriedade abrange estes quatro elementos, enquanto que outros direitos, como por exemplo, o usufruto, apenas alguns. Para fins de uma explicação breve, o direito de uso é, como o nome diz, aproveitar-se do bem para sua benesse. O direito de fruição é no sentido de obter rendimentos com o bem. O direito de disposição é a permissibilidade de transmitir o bem a outra pessoa. E o direito de retomada é a possibilidade de reaver o bem quando outra pessoa o esteja possuindo indevidamente.
Neste sentido, inclusive, é o direito de usufruto, que acaba sendo bastante difundido. Ele aborda a conjunção entre o direito de usar e fruir do bem, ou seja, de utilizar-se dele e de ganhar dinheiro com o imóvel. A possibilidade de oferta o imóvel em garantia relaciona-se diretamente com o direito de dispor dele. Afinal, eu não posso dar em garantia algo que eu não possa perdê-lo.
Agora uma questão mais prática, a fim de tentar tornar mais clara a situação: João, proprietário de um imóvel, decide locá-lo a José. José, após receber as chaves do imóvel, vai passar a utilizá-lo, porém não será o dono, que permanecerá sendo José. Nesse caso, o direito que foi transmitido a José é tão somente o de uso, permanecendo todos os demais com João. A fruição também é de João, pois ele é quem recebe pelo aluguel do imóvel. Se João recebe uma proposta para a venda do imóvel, ele pode fazê-lo, pois detém direito de dispor do bem. E, ainda, se houver um invasor no imóvel, João tem o direito de solicitar a retomada do bem.
Porém, em relação à locação do imóvel, é de se destacar que, conforme anteriormente mencionado, o direito real ele deve ser público, e portanto somente seria oponível a outras pessoas se estiver também mencionado no registro de imóveis. Caso contrário, ele não é um direito real, vinculado ao bem, mas um direito pessoal, decorrente da obrigação entre o proprietário de ceder o uso do imóvel, para com o inquilino, de pagar um valor equivalente. Imagine que, neste exemplo, o contrato não esteja registrado, e João receba uma proposta e venda o imóvel. O comprador não tem a obrigação de manter vigente a locação, justamente por não ter conhecimento dela. Entretanto, se o contrato estivesse registrado, o comprador não poderia alegar desconhecimento, pois o contrato seria público.
Importante abrir um parênteses para frisar que o registro que aqui se refere é a apresentação do contrato perante o Ofício de Registro de Imóveis. Importante destacar para evitar a confusão com o ato de reconhecimento de firma, que é realizado em Tabelionato, e que tem por função apenas certificar que a assinatura colocada no documento pertence a pessoa ali determinada. O reconhecimento de firma não registra o contrato, não o faz ser de conhecimento de todos, apenas serve de garantia entre as partes do negócio. Fechamos parênteses.
Em razão desta característica tão própria e de tamanha solidez atribuída aos direitos reais é que a eles é atribuído o grau máximo de segurança jurídica existente. Ainda que existam exceções quanto ao seu direito (por exemplo, as Terras de Marinha, exceções de usucapião, etc), a regra implica que aquele que tem o seu direito registrado perante e oponível perante qualquer um, é detentor de um direito quase que intransponível.
Uma outra questão que deve ser abordada quando falamos de direito real é em relação à posse. Porém, adentraremos nesses temas, assim como nas exceções ao direito real, nos próximos textos aqui no blog.